CORAL DE SILÊNCIOS
Na beira do rio, menino, vi canoeiros falar a língua das
águas.
Um idioma que se firmou como canto
Somente quem canta as asperezas da partida,
fala com as águas do meu rio Jequitinhonha.
Entre tons de saudade e empolgação, canoeiros
criavam conversas com as águas do meu rio.
O rio retribuía, os levando depressa, mesmo com
leves remadas
O motor das canoas era a força do canto.
Quanto mais alto se cantava no quintal de uma canoa,
o rio respondia.
Um canoeiro nunca esteve só.
Era um coral da voz do rio e suas vozes.
Por vezes mantiveram-se silenciosos, quando o rio
quer respirar, os canoeiros calam.
Quando os canoeiros querem chorar, o rio confunde
suas lágrimas...
Os chamando pra nadar
Na beira do rio, menino, vi um canoeiro que não
queria voltar.
Atravessado o rio, quisera ficar, falando ao rio em
prosa de canto:
- Vou tentar outras margens, meu rio, leve meus
parceiros pra casa...
Ao que o rio, em tom de engasgo, pôs se a gaguejar
afundando sua canoa...
- Volte a cantar, meu rio, quem canta não gagueja,
desprenda-se desse soluço, eu quero mesmo tentar
outras margens...
O rio não mais o respondia, o canoeiro perdeu o
diálogo com o rio quando deixou de cantar o agudo
da partida.
Na beira do rio, menino, o vejo escorrendo mudo
Num eterno silêncio,
Não ouço o coral das suas águas,
nem mesmo o rio tem ouvidos pra este menino,
que o atiça a curtos olhares,
Provocando seu canto, seu perdão.
Debruçado na beira da outra margem...